sábado, junho 17, 2006

A Gênese do Jornalismo de Sodalidade


É senso comum reconhecer a imprensa como o quarto poder de uma democracia. De acordo com o jornalista Luis Nassif, o jornalismo de opinião tem algumas qualidades intrínsecas que não podem ser desrespeitadas: “capacidade de análise, distanciamento crítico, isenção, senso de justiça, discernimento, respeito aos direitos individuais”*. A tese é irrepreensível e realmente são características que não devem faltar a nenhum jornalismo que se pretenda sério.

Infelizmente, hoje em dia, na chamada sociedade pós-moderna, o “quarto poder” não apresenta o principal pressuposto dos poderes democráticos: a independência. Ela garantiria o exercício de uma das principais atribuições da impressa: denunciar as práticas irregulares dos demais poderes ou setores da sociedade. Entretanto, os meios de comunicação, fábricas do jornalismo que nos forma e informa, possuem verdadeiros “contratos” político-partidários, sejam de situação ou oposição, definidos de acordo com o lucro que esse posicionamento pode render-lhes.

Além disso, a principal força motriz da atualidade é o capital. A estabilidade de todos os setores da sociedade é baseada em um mercado financeiro de interesse privado movido pela especulação e consumismo. É esse o mercado que financia o jornalismo por nós consumido, nele nosso jornalismo é negociado. Logo, os jornalistas têm de escolher entre ser leais aos interesses de seus patrões ou honrar a ética do jornalismo. “Em nossa profissão, há dias em que nos sentimos verdadeiros heróis, mas há outros em que somos um fracasso”, desabafou minha professora na universidade, jornalista experiente de várias redações, referindo-se a ocasiões em que conseguiu prestar um serviço de utilidade pública através do jornalismo e a outras, quando via a manipulação desse jornalismo a favor do interesse pessoal de seus patrões. Por isso, não são raros os casos de profissionais sérios que, fugindo da crise de consciência ética, optam pela docência ou outras áreas de atuação. O jornalismo, definitivamente, necessita de um novo ambiente para se desenvolver.

Jovens com uma Missão [Jocum] é um movimento internacional de cristãos movidos por conhecer a Deus e fazê-lo conhecido em todo o mundo e, categoricamente, é definido como sodalidade**, uma estrutura social “acessória” à sociedade, caracterizada por um estilo de ser e fazer alternativos ao do contexto envolvente, gerando um ambiente propício à inovação. A sodalidade chega a um determinado contexto social e ali move-se em função de alvos específicos.

Vivemos um momento chave em relação à comunicação, na história de Jocum e de missões. Pioneiramos o que denomina-se jornalismo de sodalidade. Esse novo contexto torna possível o respeito às qualidades intrínsecas do jornalismo. Explico: o jornalismo de sodalidade tem uma missão que, evidentemente, envolve a sociedade na qual está inserido, mas não serve a interesses privados de atores dessa sociedade. Isso é possível, principalmente, porque os recursos de um movimento como Jocum provêm de pessoas que acreditam e querem fazer parte dos projetos estabelecidos. Uma sodalidade, como ONG, pode receber recursos de instituições como igrejas ou empresas afins à sua missão, visão, valores e alvos, mas são os recursos que servem aos alvos e não o contrário. O compromisso do nascente jornalismo de sodalidade não é com a manutenção de um sistema sócio-econômico injusto, mas sim com o indivíduo, a promoção de sua dignidade e o estabelecimento de condições para que ele exerça de fato seus direitos e deveres: sua cidadania.


* Artigo “As catarses e o poder da mídia” de Luís Nassif, publicado na edição de 16 de novembro de 2005 do jornal “Folha de São Paulo”.

** Ler artigo “Igrejas locais X Agências Missionárias?”, por Bráulia Ribeiro em:
http://www.jocum.org.br/opiniao.php?materia=264 ou em “Indígenas do Brasil”, org. Ronaldo Lidório, Editora Ultimato, 2005.

quinta-feira, junho 01, 2006

Só de Sacanagem

Meu coração está aos pulos!
Quantas vezes minha esperança será posta à prova?
Por quantas provas terá ela que passar?
Tudo isso que está aí no ar, malas, cuecas que voam entupidas de dinheiro, do meu dinheiro, que reservo duramente para educar os meninos mais pobres que eu, para cuidar gratuitamente da saúde deles e dos seus pais, esse dinheiro viaja na bagagem da impunidade e eu não posso mais. Quantas vezes, meu amigo, meu rapaz, minha confiança vai ser posta à prova? Quantas vezes minha esperança vai esperar no cais? É certo que tempos difíceis existem para aperfeiçoar o aprendiz, mas não é certo que a mentira dos maus brasileiros venha quebrar no nosso nariz.
Meu coração está no escuro, a luz é simples, regada ao conselho simples de meu pai, minha mãe, minha avó e dos justos que os precederam: Não roubarás! Devolva o lápis do coleguinha! Esse apontador não é seu, minha filhinha. Ao invés disso, tanta coisa nojenta e torpe tenho tido que escutar. Até habeas corpus preventivo, coisa da qual nunca tinha ouvido falar e sobre a qual minha pobre lógica ainda insiste: esse é o tipo de benefício que só ao culpado interessará.
Pois bem, se mexeram comigo, com a velha e fiel fé do meu povo sofrido, então agora eu vou sacanear: mais honesta ainda vou ficar. Só de sacanagem!
Dirão: Deixa de ser boba, desde Cabral que aqui todo o mundo rouba e eu vou dizer: não importa, será esse o meu carnaval, vou confiar mais e outra vez. Eu, meu irmão, meu filho e meus amigos, vamos pagar limpo a quem a gente deve e receber limpo do nosso freguês. Com o tempo a gente consegue ser livre, ético e o escambau.
Dirão: é inútil, todo o mundo aqui é corrupto, desde o primeiro homem que veio de Portugal. Eu direi: não admito, minha esperança é imortal. Eu repito, ouviram? I-MOR-TAL!
Sei que não dá para mudar o começo, mas, SE A GENTE QUISER, vai dar para mudar o final!

by Elisa Lucinda



Esperança Roubada

Talvez esteja atrasado em postar esse texto só agora. Deveria estar falando sobre temas mais atuais como a violência em São Paulo... [Opa, até isso já tá passado. Mas não para os que perderam conhecidos nesses episódios].

Bom, vi o vídeo de Ana Carolina lendo o texto acima no show que fez com Seu Jorge. A sensação que tive foi estranha. Pra mim, creio que como brasileiro dos tempos da pós-modernidade, foi estranho ouvir alguém falar e defender a honestidade assim tão explicitamente. Num país como o nosso, onde um dos grandes heróis populares é Pedro Malasartes, um malandro pé-rapado que se dá bem mais pela esperza em mentir e passar os outros pra trás do que pelo suor do trabalho, um país que tem nessa prática sua marca registrada: "o jeitinho brasileiro", é dificil ouvir alguém defender abertamente a honestidade.

Sei que somos um Brasil de trabalhadores, meu pai é um exemplo de honestidade e trabalho duro, mas existe alguma coisa, lá no fundo da nossa mentalidade cultural brasileira, chamada arbitrariedade. Ela nos faz tratar a moral não em termos de "certo e errado", mas sim de "bom e mau". O que é bom ou mau pra mim, o que me é conveniente ou prejudical. O que me tráz benefício pessoal é aceitável, justificável, CERTO, independentemente se é baseado em uma mentira, se burla uma leizinha aqui; se nos poupa de pagar impostinho ou impostão ali então, mais CERTO ainda. Afinal, pra onde vai o dinheiro que pagamos ao governo? Para o bolso dos políticos curruptos e "ladrão que rouba ladrão tem 100 anos de perdão". Mas isso é tão comum e tão internalizado que ainda nos sentimos com autoridade pra criticar os políticos brasileiros.

Por aqui, não é raro comprar em um estabelecimento comercial e o caixa perguntar: "Você quer nota?". Como cidadão, me sinto ofendido com essa pergunta. Bem que poderia responder: "E você, quer me roubar?". O problema é que vemos o estado como algo independente e externo a nós. Aí você pergunta: "Como assim te roubar? Ela não estaria roubando o estado, não te dando a nota e, consequentemente, não pagando os impostos sobre aquela venda?". Sim, ela estaria roubando o Estado, mas também estaria roubando a mim e roubando a você também. O pior é quando fazem uma proposta de barganha como: "Se não emitir nota, posso fazer até um desconto". Quando você concorda com isso, aí você e ela estão roubando o restante da sociedade inteira. Pra dar uma idéia, mais ou menos 180 milhões de brasileiros no caso de um imposto federal.

Vejam o que li aqui pela net: "Se considerarmos que todo político sai de dentro de nossa própria sociedade, podemos dizer que ele é um de nós, e, por mais incrível que pareça, ninguém faz coisas erradas de uma hora pra outra, concorda? Então, quer dizer que a disfunção moral não começa quando eles assumem seus cargos políticos, mas já existiam precedentes, ainda que por nós vistos como inofensivos." (in
http://estoupensandoainda.blogspot.com/, by Talita Militão). A crise ética de nossa política não passa de um reflexo da nossa crise ética, ou melhor: moral, do dia-a-dia. Mas, não é por isso que vamos fazer um pacto de mediocridade generalizada no Brasil. Pelo contrário, me recuso a conformar-me com isso. Recuso-me a, atravéz do meu comportamento, fornecer explicação pra falta de vergonha na cara de nossos políticos.

Cada vez que tomamos conhecimento do ato de corrupção de um brasileiro, nos é roubada um pouco de nossa esperança. Esperança em nosso país e em nosso povo, em nós mesmos. Essa esperança pode ser definida como capacidade de acreditar. Ver o show de corrupção da "esquerda" no poder roubou nossa capacidade de acreditar num futuro melhor.


Proponho uma campanha de restituição da esperança. Cada vez que e escolhermos não tirar vantagem ilicitamente de algo, cada vez que devolvermos o troco que vem a mais, que tentarmos encontrar os donos de coisas valiosas que achamos perdidas. Cada vez que atingirmos a outros com atos de honetidade, estamos restituindo, devolvendo essa esperança roubada. Temos esse poder, eu tenho esse poder e vou usá-lo. "Só de sacanagem!"